domingo, 10 de agosto de 2014

O chão do Aécio é mole

Enredado em dissimulações o tucano tem dificuldades e já constrange as audiências, que viam nele um biombo para o retorno dos heróis do mercado. À medida em que a campanha presidencial supera a fase alegre dos consensos, ancorada em sorrisos e manchetes de credibilidade equivalente, o bicho pega.

As pesquisas de intenção de voto exalam um cheiro de queimado e a fumaça ondula na direção do palanque conservador. Exceto na hipótese de um novo escândalo inoculado pela mídia, a dúvida confidenciada em fileiras de bicudos e graúdos carrega nervosa pertinência.

De onde, afinal, Aécio e assemelhados vão extrair o fôlego que as pesquisas lhes sonegam, se meses e meses de exposição exclusiva e esfericamente favorável na mídia não foi capaz de lhes proporcionar o estirão previsto na preferência nacional?

A partir do dia 19, a propaganda eleitoral abre uma trinca nesse monólogo.

Faz mais. Temas cruciais para o desenvolvimento brasileiro, como a redução da desigualdade, o futuro do salário mínimo, a desindustrialização, passam a exigir um posicionamento claro de quem pretende chegar competitivo às urnas de outubro. Na boca de Aécio Neves eles queimam como batata quente.

A dificuldade de discorrer com clareza sobre esses itens revela dois flancos mortais em uma disputa presidencial. De um lado, a fragilidade de um projeto que não pode se explicar honestamente ao eleitor, sob pena de evidenciar seu conteúdo antissocial. De outro, o chão mole mais incomodo do palanque conservador: seu próprio candidato. Visto com entusiasmo como um biombo para o regresso dos heróis do mercado a Brasília, o tucano às vezes soa como um piano difícil de escutar e de carregar.

Enredado na teia da dissimulação Aécio Neves tem dificuldades evidentes com a consistência. Expor como enxerga e de que modo pretende equacionar os grandes gargalos brasileiros é uma tarefa acima de suas possibilidades. Sua incapacidade de discorrer mais que alguns segundos sobre um mesmo assunto, depois de esgotar o estoque de lugares comuns, começa a constranger as audiências mais receptivas.

Em encontro recente com industriais, promovido pela CNI, o desconforto na plateia era mais denso do que a enorme boa vontade com o jovial neto de Tancredo. Mesmo lendo, ficou flagrante que debulha uma espiga adversa quando se trata de discorrer sobre o país, seus flancos e suas possibilidades. Não é sua praia. Aécio é mais afeito à ligeireza do que ao manejo das grandes agendas nacionais.

Lula, que hoje tem o Brasil na palma da mão, faiscava em 2002 uma experiência de vida riquíssima, coisa que o mineiro tampouco possui. Da boca do metalúrgico emergia o arranque sofrido de milhões de personagens e sonhos de um Brasil quase ausente do repertório dominante. Do esforço de Aécio se ouve uma versão empobrecida da narrativa gordurosa, monótona e burocrática dos editoriais conservadores.

Dilma não tem a vivência popular de Lula. Mas dispõe de uma densidade técnica e intelectual , ademais do domínio e da experiência no manejo da máquina do Estado, da economia e da infraestrutura nacional, que a singularizam de imediato aos olhos do observador isento.

Aécio é o próprio jogo. Mas o placar não anda com ele. O discurso linear, desprovido de ênfase, sucedido de improvisos jejunos, revelam cada vez mais a natureza fraudulenta do produto que a mídia vende como sinônimo de ‘mudança’.
 
A campanha, porém, ingressa numa fase em que o tucano será instado, cada vez mais, a esclarecer suas propostas para o presente e o futuro brasileiro. É a hora em que as batatas queimam na boca do conservadorismo. Pior que isso. A hora em que o próprio Aécio se torna uma delas. (Fonte: Blog Conversa Afiada)

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