sábado, 25 de agosto de 2012

“Que sociedade nós queremos no futuro?”

A excelente decisão tomada pelo governo de propor ao Congresso, aos governadores e prefeitos, negociação para a destinação de 100% dos recursos oriundos dos royalties do petróleo e do pré-sal, mais 50% do Fundo Social do Petróleo para a educação, recebe aplausos dos mais diversos setores da sociedade. É consenso que precisamos dar um salto na área. Como? Esta é a questão. Para contribuir com este debate, conversamos com o educador e ex-reitor da Universidade de Brasília, Antônio Ibãnez, que também trabalhou no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, e hoje integra o Conselho Nacional de Educação.

Está mais do que na hora de pensarmos qual sociedade nós queremos. Uma que gaste todos os recursos do pré-sal, esse tesouro que temos debaixo do Atlântico; ou outra que usufrua deles na formação de pessoas que realmente vão ter condições de estruturar o futuro do país. Esse é o “xis” da questão, o que está por trás desse debate.

Neste sentido, na minha visão, as medidas anunciadas são mais do que fundamentais. Primeiro porque esse debate no Congresso é muito difícil. Segundo, porque os Estados estão limitados por conta da arrecadação e da estrutura de impostos que têm. Então, tem de ser o governo federal ajudando. Os royalties podem ser a solução que a União e o país precisam.

Temos de entrar em contato com as sociedades científicas, as entidades como a União Nacional dos Estudantes e os ministérios. O MCTI e o Ministério da Educação estão unidos nesta luta. E levar esse debate às Assembléias Legislativas porque os problemas estão nos Estados e nos municiípios. Agora, tem de ser uma campanha pesada, nacional, em várias esferas e muito rápida. Até porque, após as eleições, esse projeto vai entrar em discussão no Congresso.

Nós não vamos dar nenhum salto neste país na área educacional se não dermos outro tratamento para os professores. Claro que precisamos das reformas estruturais do ensino médio. Mas, friso essa necessidade para com os docentes, em especial os que atuam na educação básica. Eles precisam de maiores salários e que sejam compatíveis com a função que desempenham que é a de formar o futuro do país. Precisam urgentemente de um tratamento específico, formação continuada e de qualidade.

A universidade está ciente do papel que pode exercer para o desenvolvimento do país. Mas, ela ainda está muito fechada. Eu fui reitor da UnB e estou acompanhando agora o processo de eleição para reitoria. Nenhum dos programas que vi (dos candidatos) traz Brasília para dentro da universidade, ou o contrário: estimula que a universidade saia para a cidade e para o Brasil como um todo. A universidade ainda está muito centrada na comunidade acadêmica. Embora, do ponto de vista da pesquisa e da produção, tenha havido um avanço grande ligado ao setor produtivo. Mas este avanço ainda está aquém. A universidade brasileira tem de se abrir para a sociedade.

A própria avaliação das universidades e dos professores está calcada na quantidade da produção científica, o que leva a um estrangulamento. Há professores que ficam mudando um parágrafo de um paperl para publicar em duas revistas o mesmo texto e atingir a meta - o que é ridículo do ponto de vista do desenvolvimento.

Não pode haver essa exacerbada pressão para a produção científica porque os professores precisam estar mais livres para produzirem. Agora, esse marco regulatório já está colocado, é uma questão de paciência. Você não dá o salto entre a universidade e o setor produtivo de uma hora para outra. Isso leva tempo, amadurecimento, até que as coisas se encaixem.

Eu acho que é um avanço, mas é fundamental que tenhamos uma discussão maior sobre a forma que esta legislação será implementada. Apesar de já ter sido aprovado o projeto, talvez por falta de entendimento, há setores fundamentais que ainda não compreendem as cotas. Então, isso precisa ser mais discutido por meio de um debate sadio.

O desenvolvimento que a CT&I tiveram no governo Lula foi impressionante. Tivemos uma expansão enorme na área. Começamos com financiamento para a inovação dando incentivos às empresas. Agora, por conta do contingenciamento, nos últimos dois anos, nós estamos com certa restrição. O país precisa de ciência, ela é a base para a tecnologia e a inovação. Se não tivermos um referencial e sem inovação embutida no setor produtivo não teremos chances de competir no mundo.

Nos últimos dois anos foram formados cerca de 35 mil doutores, por conta da expansão das universidades, das bolsas... Um contingente, porém, que conta com recursos limitadíssimos para fazer pesquisa. O Brasil quer ter projetos estruturantes, que mudem a capacidade de pesquisa e deem um salto qualitativo, mas esses projetos não podem ser financiados apenas com os recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

Como, por exemplo, o acelerador de partículas de terceira geração que o Brasil está começando a construir em Campinas, um projeto de R$ 500 milhões que demanda recursos além dos recebidos dos fundos setoriais. Ou o caso do reator nuclear multipropósito que fará com que o Brasil se torne independente no tratamento do câncer. O país precisa de grandes projetos estruturantes como esses.

Com os recursos destinados a eles hoje, não teremos como manter a expansão que já tivemos. Sem falar que será difícil incluir esses doutores que já se formaram ou os do programa Ciências Sem Fronteiras que vão retornar ao país. Nós precisamos, portanto, de mais recursos para Educação, Cieência e Tecnologia. Para que possamos pensar em uma outra sociedade que esteja à altura dos desafios do futuro. (Blog do Zé Dirceu)

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