domingo, 22 de dezembro de 2013

De Duciomar a Zenaldo, nada mudou

Durante o feriado do Carnaval de 2009, três pessoas morreram no Hospital Pronto Socorro Municipal Mario Pinotti, o PSM do Guamá, como é conhecido pela população da Região Metropolitana. Parentes das vítimas, na época, acusaram a falta de médicos no plantão. Naquele feriado, a unidade estava lotada, e alguns pacientes chegaram a esperar atendimento por até 16 horas, mas não conseguiram passar por um médico. A secretária municipal de Saúde era Rejane Olga Jatene – irmã do atual governador Simão Jatene. Ela, outros quatro ex-secretários de Saúde e o ex-prefeito Duciomar Gomes da Costa, foram condenados pelo Tribunal de Contas a ressarcir recursos para o município.

O episódio do fatídico Carnaval de 2009 ganhou manchetes no Brasil e no mundo. Belém do Pará foi alvo de imagens negativas e da indignação de milhares de pessoas. O episódio poderia ter servido para mudar o perfil do atendimento da unidade de saúde, promovendo um atendimento mais humano à população. Não foi exatamente isto que aconteceu. Bastaram três meses para o mesmo Hospital de Pronto Socorro ganhar novamente os holofotes da imprensa nacional. De forma negativa, claro. Nada mudou. Superlotado, o PSM do Guamá recebeu uma criança vítima de afogamento. O socorro pode ter chegado tarde, mas atender ao pequeno Caio Vasconcelos em uma pia de inox foi humilhante, foi degradante para todas as famílias paraenses.

Mas o PSM tem história. Em 2008 o Ministério Público Federal realizou uma vistoria no hospital. O objetivo da inspeção era verificar se o Poder Municipal estaria cumprido às obrigações firmadas com o Ministério da Saúde para aplicação dos recursos repassados. O que a inspeção constatou foi a falta de medicamentos básicos para o atendimento a quem procurava a unidade. Faltavam desde gazes até antibióticos vitais para salvar vidas. Não havia sequer água destilada para utilização em curativos. Os usuários relatavam que não havia nenhum neurologista no PSM e o tomógrafo estava quebrado. Pacientes, em estado grave, necessitando urgentemente de exames, precisavam aguardar a liberação de uma ambulância para efetuar o transporte, já que tal procedimento estava sendo realizado na Beneficente Portuguesa.

Desobedecendo a recomendação anterior, da própria Procuradoria da República no Pará, não foram atendidas mínimas condições de segurança aos pacientes e servidores, tais como: não houve reparo dos alarmes localizados no posto de enfermagem; as instalações sanitárias continuaram inadequadas; as escadas continuavam sem oferecer a mínima segurança aos usuários; em muitos pontos do PSM, não existiam extintores; não foi efetuado o reparo do elevador; os servidores não utilizam equipamentos de proteção individual; não foram eliminados os focos de larvas e mosquitos.

Pelo contrário, foi constatada condição insalubre para os usuários e servidores. Alimentos, roupas sujas, pacientes e visitantes eram transportados no mesmo elevador. Na pediatria, existia uma mesa de apoio para atendimento completamente oxidada, enquanto que na enfermaria, não existiam cadeiras para acompanhantes.

Pior: foram detectadas várias lixeiras sem tampas e caixas de papelão improvisadas, funcionando como descartes de todo tipo de material. Banheiros com sanitários entupidos, o que revelava a falta de manutenção da estrutura hidráulica do prédio. As condições de higiene dos banheiros eram totalmente inadequadas. Estamos falando de 2008.

Em outubro de 2013 um grupo de trabalho da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados realizou, in loco, o levantamento da situação dos hospitais de urgências médicas do Sistema Único de Saúde, incluindo o Hospital Mario Pinotti. Em novembro o relatório foi apresentado no seminário “O Caos no Atendimento de Urgência e Emergência no Brasil”, na Comissão de Direitos Humanos e ganhou o apoio do Conselho Federal de Medicina, do Ministério Público, da Ordem dos Advogados do Brasil e do Conselho Nacional de Justiça, que apresentaram conjuntamente o documento. No relatório, concluído a pouco menos de dois meses, foi denunciada a existência de pacientes internados em macas pelos corredores ou em colchões sobre o chão e “casos que se assemelham aos de uma enfermaria de guerra”, revelou o relatório final.

O relatório sobre o Hospital de Pronto Socorro Municipal Mario Pinotti, apresentado durante o seminário, mostrou que o espaço para atendimento da emergência do hospital é pequeno e inapropriado, antigo, e cheio de “remendos”. Nos corredores foram encontrados vários pacientes em macas. Um dos exemplos citados foi o de um paciente com 83 anos, que estava esperando há dois dias para solucionar um caso de “espinha de peixe na garganta”. De acordo com os médicos plantonistas, essa ocorrência é comum no hospital e foram relatados casos de espera de mais de 12 dias.

Ainda de acordo com o relatório, as enfermarias apresentavam precárias condições sanitárias e de conforto. “Constatou-se que as instalações de grande parte do hospital são antigas, com problemas no sistema de ar condicionado, no esgotamento, nos elevadores, falta de água em bebedouros e banheiros em más condições”, define o documento. O hospital, de acordo com a inspeção feita pela Comissão de Direitos Humanos juntamente com o Conselho Federal de Medicina, não possui autonomia, nem administrativa nem financeira. Todas as compras são realizadas pela Secretaria de Saúde Municipal. “A falta de autonomia causa dificuldades à celeridade da gestão”, afirmam os integrantes da Comissão. (Fonte: Diário do Pará)

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