... Assim, teve curso o processo de ‘modernização’ da atividade produtiva da grande fração dos agricultores familiares, ainda não integrados, sob a base tecnológica que orientou a modernização da grande exploração agrícola a partir dos anos de 1970...
A qualificação conservadora para esse processo se deve, no mínimo, a duas razões:
1. ao fato de, a exemplo da estratégia correlata para a grande exploração, não ter envolvido mudanças na estrutura da posse da terra. O programa de reforma agrária executado no período recente, sequer reduziu as áreas de minifúndios. Pelo contrário, a modernização vem ocorrendo com a ampliação da área desses imóveis que, de 2003 a 2010, passou de 39 milhões de hectares para 47 milhões de hectares, segundo o Incra. Obviamente, essa faixa dos camponeses minifundistas é aquela potencialmente mais ameaçada;
2. pela disseminação, no universo da agricultura familiar, da matriz tecnológica da ‘revolução verde’.
No que tange a este último ponto, considere-se, em decorrência, o fortalecimento da inserção da agricultura familiar nos circuitos capitalistas convencionais da produção e consumo agrícola hegemonizado pelo agronegócio.
Resulta que o próximo Censo Agropecuário deverá atestar o fenômeno de aceleração do abandono da prática da diversidade de cultivos e de variedades por parte desse segmento produtivo, dando espaço para a consolidação da homogeneidade genética e monoculturas e assim pondo em risco os serviços ambientais inestimáveis prestados pelos camponeses, como na conservação da biodiversidade.
Dessa forma, com a modernização da agricultura camponesa pelo nivelamento às condições da agricultura produtivista, a biodiversidade passa a ser ainda mais ameaçada, daí restando maiores desafios para a segurança alimentar num cenário de profundas incertezas com o quadro de mudanças climáticas. Associadamente, o crescimento dessa especialização da produção, para o mercado, além de afetar os atributos do autoconsumo das unidades camponesas, intensifica a ‘adesão’ da oferta agrícola desses agricultores ao padrão alimentar fordista.
Ademais das perdas biológicas, nutricionais e de qualidade em geral dos produtos de origem camponesa, equiparando-os aos da agricultura produtivista convencional, esse processo gera reflexos no comprometimento da produção diferenciada das culinárias regionais e, subjacente, provoca erosão em costumes e tradições locais, implicando, pois, em perdas culturais.
Ainda no que tange ao segundo ponto, causa apreensão, pelas consequências políticas e econômicas, a tendência de subordinação plena dos agricultores familiares aos oligopólios resultantes da unificação técnica e econômica dos setores da genética e da química que compõem a indústria intermediária da agricultura convencional. Da mesma maneira, preocupa a relação similar com os segmentos da mecanização agrícola convencional que passou a ser disseminada com o programa ‘Mais Alimentos’, por meio do qual foi levado a cabo o que avaliamos como o último estágio da modernização da agricultura familiar. (Gerson Teixeira é Assessor Parlamentar - Lotado no Gabinete do Deputado Federal Beto Faro)
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